A viagem.

05/11/2012 12:26

Há uns 8 anos perdi um grande amigo, foi na ocasião da passagem do furacão catarina então sempre associei a tempestade com esse acontecimento que me marcou muito. Ele era um jovem na sua terceira viagem com o caminhão do pai e se acidentou na bahia.

Na noite seguinte, tive um sonho lúcido que me impressionou e acordei na madrugada fazendo questão de registrar tudo que me lembrasse. Depois devo ter fantasiado alguma coisa, sem dúvida, porém a essência do sonho consegui colocar no texto.

Revirando escritos de gaveta encontrei o texto e achei legal publicá-lo:

 

 

 

 

 

 

Acordei de um sonho estranho

Deitado numa grama branca

Mais branca que qualquer filme branco que já vira.

Todas as coisas eram brancas ao extremo

Ao lado ia um asfalto branco

Tão branco que reluzia ao longe

Como vim parar aqui não sei

Olhando à distância havia algo com um pouco de cor

Quando fui chegando perto vi lindas maçãs caidas no asfalto

Eram vivamente vermelhas

Tão vermelhas que escorriam

Naquele cenário todo branco

Mais a frente destroçoes de um caminhão branco

Retorcido e destruido

Foi quando lembrei

Que devia terminar a viagem

Mas onde estava meu "cargo"?!

Como vim parar ali?!

Lembrei-me vagamente do posto

De onde havia parado e ligado para casa.

Minhas pernas estavam leves

Andei por horas sem me cansar

Aquele asfalto branco sumia de vista

E havia uma música bem baixa pelo ar

Eram como pássaros, canários

Mas com uma melodia mais leve

E muito mais longa

Não havia mais nada

Nem vento, nem céu

Tudo branco, extremamente branco

Tinha que achar meu caminhão

Mas que loucura

Esta parte da estrada eu conheço bem

Meus pés não andavam mais

Deslizavam sobre o asfalto branco

E sem dúvida essa era a entrada da minha cidade.

Ao longe, percebi lugares conhecidos

Viadutos, casas porém tudo branco

Entrei pela rua geral do meu bairro

E lá na frente algo ganhava cor

Sim, era bem colorido

Sem dúvida era real

Era a sorveteria de um grande amigo

Poderia parar ali antes de ir para casa

A porta estava aberta

E lhe chamei como sempre fazia

Ele veio, me olhou com uma expressão estranha

E parecia não ter me visto

As ruas e as casas à volta continuavam brancas

Mas meu amigo tinha cor

Era real

Então parecia não ser uma visão ou sonho

Ele fechou a porta e saiu

Pra onde iria?!

Por que não me via?!

Lhe chamei mas ele já ia longe

Mas eu sabia pra onde iria

A lanchonete que tinha videokê

Quantas músicas nós já haviamos cantado ali

Nesse momento estava ao seu lado

Ele cantava como nunca antes

Mas não sei como estava ali tão rápido

E ele cantava sem me perceber

Isso era muito estranho

Por que não me via?!

Tenho que ir para casa!

Imediatamente estava em frente ao portão!

Que sonho maluco!

É só pensar e vou para onde quero.

A casa estava vazia

Fui ao quarto da minha mãe

Mas ela dormia na minha cama

E parece que sonhava

Pois dormindo me chamava

Então eu disse: "Estou aqui. Já voltei!"

E ali na garagem estava meu carro

Mas onde deixei as chaves?!

Poderia ir a um baile

Era sábado à noite

Não me sentia cansado

Não sentia nada

A noite voou em segundos

A casa continuava vazia

E aquela musica no ar não parava

Então alguém se aproximou

E sentou ao meu lado

Que estranho, meu amigo que raras vezes tinha tempo de ir em casa

Estava ali mas não dizia nada

Estava triste, como nunca antes cira

Escrevia rápido num papel amassado

Pouco á pouco percebi outras pessoas ao meu lado

Meu tio, minhas primas e tias

E minha mãe ainda estava deitada

Não houvia vozes, só aquela música pelo ar

Vários rostos iam e vinham

Mas não encontrei meu pai

Nem meu irmão

Este já está sendo um sonho ruim

Preciso acordar!

Preciso chegar ao meu destino

Continuar a viagem.

Me sentia tão leve como se pudesse flutuar

Uma paz muito grande me envolvia

E aquela música continuava baixinha

Já era outro dia

Havia muitas pessoas na casa

Mas seus rostos passavam por mim como flashes

Por fim encontrei meu irmão

Pude ouvir sua voz

À contar que tinha sido assaltado

Estava muito machucado

Tentei lhe falar mas ele não ouviu

Onde estará meu pai?

Por que não o vejo?

As pessoas se aglomeraram no portão

Todas eram brancas

Transparentes

E outras eram normais. Reais.

Tenho que acordar!

Eles carregavam algo de um carro

Este objeto era real

Carregado por braços invisiveis

Foi posto bem no meio da sala

Era um caixão.

Alguém explicou que não podia ser aberto

Apenas um vidro sobre o rosto.

Quem estava ali?!

Era meu pai?!

Do quarto saia alguém

Ele começou a ganhar forma

Agora muitos amigos estavam ali

Estavam abatidos mas não os podia ouvir

E vi quem saia do quarto

Do meu quarto

Era meu pai.

Ele tinha uma foto na mão

Então que mestava no caixão?!

Algo frio tomou conta de mim

Uma mão gelada em meu coração

Meu pai chegou perto do caixão

E depositou devagar a foto.

Meus pés vacilaram

Senti um aperto no peito

Enquanto a música se tornou mais alta

Eu precisava olhar

A música me puxava

Sentia que podia flutuar

Ela ganhou tons de violinos e trombetas

Um feixe de luz se abriu no céu

Bem em cima do caixão

Estava flutuando rumo à luz

Já não era mais um sonho

Pude ver e ouvir todos os meus mais queridos amigos

Todos chorando

Então olhei para baixo

Direto na tampa de vidro

Vi quem estava no caixão

A música estrondou num clímax

Depois restou um murmurio baixo

A luz se tornou mais forte

Era um tubo perfeito

Tudo estava de novo branco

E não havia mais choro

Só a música baixa

E uma voz de anjo chamando

Me senti totalmente leve

E fui subindo lentamente

Muito devagar

Para dentro da luz.